Postado em 25/05/2020
A escola é, para muitos, o primeiro contato com o mundo fora da família, e é nela onde inicia-se o primeiro contato com brincadeiras e jogos em grupo. No contexto escolar, atuar com lutas e artes marciais como parte do currículo pode assustar num primeiro momento, visto que é um tema pouco abordado e, muitas vezes, confundido com violência.
No entanto, apesar de ser um assunto muito instigante, é pouco desenvolvido nas aulas de Educação Física Escolar, sobretudo porque, em geral, os professores não têm conhecimento sobre como trabalhar esse conteúdo nas aulas, ou, ainda, sentem-se inseguros porque nunca tiveram a oportunidade de praticar ou mesmo de conhecer uma arte marcial.
Outro motivo que podemos citar como limitador do trabalho com as lutas e as artes marciais dentro da escola são os poucos estudos voltados para essa temática.
O trabalho com as lutas e as artes marciais vem, de diversas maneiras, se justificando dentro do ambiente escolar. Temos como exemplo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Educação Física, uma vez que, dentro dos blocos de conteúdo indicados para o trabalho na área, o termo “Lutas” é evidenciado como possibilidade de desenvolvimento.
Já na esfera social mais ampla (educação não formal), temos diversos veículos de mídia bombardeando a sociedade com essas práticas, como novelas (Fina Estampa) e seriados (Malhação), além de TUF (The Ultimate Fighter) e UFC (Ultimate Fighting Championship), ambos exibidos pela Rede Globo de Televisão.
Academias de lutas e artes marciais espalhadas por vários espaços das cidades e escolas de educação infantil com atividades extracurriculares nessa área também são indicativos da relevância do tema na sociedade.
Fica evidente, assim, a relevância do trabalho com as lutas e as artes marciais nas aulas de Educação Física Escolar. Todavia, como realizar esse trabalho? Tenho que ter experiência em lutas/artes marciais para poder desenvolver esse conteúdo nas aulas? Não tenho materiais (tatame, luvas, espadas, bastões), então, como desenvolvo essas aulas?
Lutas e artes marciais no contexto escolar
Um dos pontos mais importantes na jornada de quem inicia o assunto luta/artes marciais é quebrar o rótulo de que se trata de “briga”. Portanto, diferenciar “briga” de “luta” é extremamente importante.
É necessária a constatação de que onde existe “briga”, existe violência e o ônus que isso implica, como as punições previstas aos que incorrem nesse erro. Já as lutas apresentam uma conotação diferente; elas são tratadas como bônus sempre (podem gerar um medalhista, um campeão, por exemplo).
Precisamos também entender e saber distinguir os termos Lutas e Artes Marciais, visto que, muitas vezes, são compreendidos como sinônimos. O termo “luta” pode ser identificado de diferentes maneiras. Como afirmam Correia e Franchini (2010), esse termo tem uma dimensão polissêmica, ou seja, possibilita uma diversidade de representações e significados.
Podemos citar como exemplo dessa polissemia a utilização do termo “luta” quando nos referimos a lutas dos sem-terra, luta de classes, luta dos trabalhadores, luta pelo direito das crianças, entre outros. Nesse contexto, a expressão “lutas” é genérica.
Já as artes marciais podem ser entendidas como um conjunto de técnicas corporais utilizadas em situações específicas de ataque e defesa, tendo, muitas vezes, aspectos filosóficos e religiosos no cerne de sua criação. Para Correia e Franchini (2010), a expressão “arte” nos remete a um contexto expressivo, imaginário, lúdico e criativo, que se insere no processo de construção das manifestações corporais ligadas ao universo das artes marciais. Já o termo “marcial” está ligado às dimensões conflituosas das relações humanas, e tem origem no deus Marte (deus romano da guerra; Ares para os gregos).
Nesse sentido, as lutas e as artes marciais podem ser compreendidas como manifestações antropológicas distintas e multifacetadas, sendo que, em nossa sociedade atual, suas representações são carregadas de sentidos e significados decorrentes de diversas fontes de estímulo a que o sujeito tem acesso.
Alguns trabalhos sobre lutas e artes marciais nas aulas de Educação Física Escolar foram publicados nos últimos anos, o que nos permite inferir que essa manifestação corporal vem sendo aos poucos reconhecida pelos professores, muitos dos quais vêm se “arriscando” nesse campo de trabalho com os alunos.
Lutas como instrumento pedagógico
Ainda que o professor não tenha uma formação ampla no assunto que irá ser trabalhado, é possível, ainda assim, trabalhar dentro da realidade da estrutura física da escola, bem como da sua formação profissional.
Importante salientar que, em ambientes escolares, as lutas devem ter abordagens diferenciadas das lutas trabalhadas em academias.
O professor de Educação Física acostumado a criar, a inovar em atividades recreativas e jogos pode facilmente propor exercícios para treinar equilíbrio, agilidade e força.
É necessário o professor ter conhecimentos básicos sobre as aulas praticadas, da mesma forma que o professor deve buscar o conhecimento quando precisar ensinar uma modalidade esportiva, atletismo ou uma atividade recreativa aos seus alunos. O estudo e a busca de informações para construir suas aulas de lutas podem seguir da mesma forma.
Esse assunto abre vários caminhos e serve de ponto de partida para alguns eventuais debates sociais. Com certeza, ao se trabalhar lutas na escola, a palavra “violência” será a primeira a ser cogitada, e essa confusão vai permanecer se o termo não for bem explicado e conceituado.
Nas lutas, assim como em outros desportos, as meninas praticantes sofrem dois tipos de preconceito: o primeiro é serem identificadas como masculinizadas, e o segundo, que se submetem a uma manifestação da cultura corporal ligada essencialmente a uma das matrizes de gênero, no caso, a masculina.
Estamos tentando trazer um conceito dinâmico de bom entendimento, no qual a palavra “luta” esteja bem empregada e possa, assim, ser recebida sem discriminações ou erros conceituais.
Será necessário, então, o professor de Educação Física recorrer a livros e a outras fontes de informações, para que possa disponibilizar uma modalidade que se integre totalmente dentro dos padrões escolares, de modo a não sofrer riscos de preconceito ou indiferença. É preciso esclarecer que a modalidade visa trabalhar não somente o corpo, mas também a mente dos alunos.
Em geral, os preconceitos começam a surgir pelo fato de muitas escolas não terem uma estrutura adaptada à prática desse esporte. Assim, é necessário haver dedicação, criatividade e cooperação de todos, para que as aulas possam acontecer de um modo que desperte o interesse e a vontade dos alunos.
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Fonte: blogeducacaofisica.com.br